Oi, e meu nome não importa, e eu morri hoje. Morri de
overdose às oito horas e quarenta e nove minutos da manhã dessa segunda-feira.
Morri sozinho, dentro do meu quarto.Tinha acabado de chegar de mais uma noite
alucinógena junto a meus amigos. Cheguei a casa às sete horas e cinqüenta
minutos. Tinha passado toda a madrugada e boa parte da manhã em boates me
drogando.Ao chegar em casa, fui diretamente ao meu quarto; não olhei nem para
os lados. Entrei nele, e o tranquei com cadeado para que ninguém entrasse;
queria ficar sozinho! Meu quarto estava frio, e como eu havia fechado as
janelas, estava um tanto escuro também. Apesar de ter passado horas e horas
perto de amigos, escutando música alta e fazendo o uso de drogas, eu ainda
estava angustiado, triste, revoltado e me sentindo desprezado. Passei uns
trinta minutos deitado na minha cama e tentando lembrar de tudo que havia
acontecido, mas como não lembraria tão cedo, decidi me drogar... De novo. Fui
rapidamente até o meu armário, puxei uma das gavetas bruscamente, e logo em
seguida, peguei uma seringa, que, por sinal, já estava usada. Procurei nas
outras gavetas a metanfetamina, e logo depois a encontrei debaixo do meu
travesseiro enrolada a um papel. Peguei um copo com água que estava em uma das
prateleiras do meu quarto, e misturei a metanfetamina a ele. Depois de
misturá-los, o coloquei na seringa. Meu ser gritava de vontade por aquela droga.
Escolhi a veia, e em uma tentativa de tirar todo aquele lixo psicológico que
estava em mim, ejetei toda aquela substância tóxica em mim. Fiquei eufórico,
demasiadamente alegre e atento. Podia ouvir claramente cada ranger de móveis do
meu quarto. Dei algumas risadas sozinho sem saber o porquê de tal. Sentia-me
“bem”. Depois de alguns minutos, todo o efeito havia passado, e todos os sentimentos
que sentia antes, voltaram mais intensos ainda. Não sentia mais apenas tristeza
e angustia, sentia uma depressão profunda.Comecei a
chorar desesperadamente. Me sentia completamente sozinho; tudo o que eu queria
naquele momento era o abraço de alguém. Eu queria minha mãe ali do meu lado. Eu
chorava e chorava, porém ninguém ouvia, logo lembrei que minha mãe havia ido
trabalhar, e meu irmão estava na escola. Lembrei das tantas e tantas vezes que
fiz minha mãe chorar por causa do meu vício. Lembrei das brigas, dos móveis
quebrados e das agressões ocorridas por minha causa. Lembrei claramente do dia em que meu irmão ficou abraçado com minha
mãe no canto do quarto com medo de mim. Podia escutar claramente naquele
momento os xingamentos que os vizinhos faziam contra mim quando eu saia na rua.
Comecei a lembrar dos boatos a meu respeito, tais como: “Aquele drogado mais
uma vez foi expulso de sua casa.”, ou “A polícia mais uma vez foi chamada na
casa daquele viciado”. Sempre que escutava os boatos, tentava não ligar, mas
naquele momento aquilo estava me corroendo tanto por dentro! Senti-me o
verdadeiro lixo naquele momento. “Drogado! Viciado! Você não presta! Se você
morrer, vai fazer um favor à sua família e a seus vizinhos!” Uma voz sussurrava
tudo isso a meus ouvidos. Chorava lágrimas de sangue enquanto pensava em tudo
isso. Onde estavam meus “amigos” naquele momento? Puxei meus cabelos, e rasgue iminhas roupas
de tanto desespero. Gritava de tristeza. Lembrei que o meu vizinho ia a igreja
e sempre andava com a bíblia de baixo do braço. De vez em quando escutava uma
música evangélica saindo da casa dele. Como ele era evangélico, pensei que talvez
ele pudesse me ajudar. Talvez o Jesus que ele acreditava pudesse fazer algo por
mim. Pensei em ir até a casa dele perguntar o que a bíblia que ele lia, falava
sobre mim. Iria perguntar se havia jeito pra mim, e se o tal Jesus pudesse
mudar minha situação. Entretanto decidi não ir, afinal de contas, ele nunca
havia falado comigo. Achei estranho porque mesmo ele sabendo de tudo que estava
acontecendo comigo e minha família, nunca veio falar de Jesus pra mim. Será que
até ele tinha medo de mim? Como aquele momento estava tão desesperador, não
deu tempo de raciocinar muito, e questionar-me por que ele nunca havia falado
de Jesus pra mim, com isso, logo conclui que eu não era dígno de saber quem
era Jesus, afinal, se eu fosse, o meu vizinho teria falado dele pra mim. Comecei
a olhar para as paredes do meu quarto.Quem diria que meras quatro paredes
feitas de tijolos e cimento seriam testemunhas de uma das vidas mais
lamentáveis que já havia vindo a esse mundo, e essas mesmas paredes, estavam
prestes a registrar o fim de tal vida; o que seria um descanso para elas. “Chega!
Esse tormento acabará hoje!” Pensei eu naquele momento. Foi então que peguei
todo o armazenamento de drogas que eu tinha guardado no meu armário. Juntei
todas, desde as líquidas, passando pelos comprimidos e ervas até chegar às
pedras. Fui até o armário de remédios da minha casa, procurei o remédio tarja
preta que minha mãe usava justamente por minha causa, e o coloquei junto as
demais drogas. Tirei cada comprimido de sua embalagem, peguei um copo d’água e
os tomei. Todos. Senti minha garganta sendo machucada de tantos
comprimidos que havia consumido. Não perdi tempo, e logo
depois peguei todas as drogas ejetáveis, as misturei e apliquei tudo em minha
veia. Estava tão desesperado naquele momento, que na primeira tentativa, acabei
estorando uma de minhas veias. “Está feito!” pensei. Não incomodaria mais a
vida de ninguém. Minha mãe e meu irmão, que eu tanto amava mas
não pude demonstrar meu amor por eles, poderiam viver em paz agora e meus
vizinhos não ficariam mais preocupados pelo fato de ter um drogado na
vizinhança Tudo ficaria melhor com a minha morte. Naquele momento, lembrei dos
momentos em que era feliz. Lembrei das vezes em que eu era criança e minha mãe
levava eu e meu irmão no parquinho. Nós brincávamos, corríamos, tirávamos fotos
e tudo mais. Sabe, minha mãe levava eu e meu irmão pra tomar
sorvete,... Era da hora, sabe? Às vezes eu fazia uma birra por minha mãe dá mais
atenção a meu irmão por ele ser mais novo, mas era só pra chamar a atenção.
Minha mãe me levava na escolinha, e eu falava pro meu irmão ”Um dia você vai ta
aqui comigo, e a gente vai estudar junto irmão!” Quando eu lembrei disso, uma
lágrima caiu do meu rosto.Eu os amava tanto, mas não podia dizer mais
isso pra eles. Lágrimas saíram do meu rosto de amor a minha família. Como eu
queria estar aí no seu lugar agora. Ter o privilégio de abraçar meu pai, minha
mãe e meus irmãos e falar que o amo. Cara, dá mais valor a tua família!
Dá mais atenção pra sua mãe, tenta ser mais amigo do seu irmão! Será que você
continuará dizendo que odeia seu irmão na cara dele, que não suporta olhar pra
cara do seu pai porque ele é “chato” com você? Mas voltando à minha história... Já era tarde
pra mim, aquelas substâncias naquele momento estava correndo por minhas veias e
destruindo tudo o que tinha pela frente. Não demorou muito para a primeira
espuma sair de minha boca. Logo veio mais e mais... Minha respiração começou a
ficar cada vez mais e mais ofegante. Minha visão começou a escurecer e eu
comecei a perder os sentidos; larguei a seringa de minha mão. Um frio sobrenatural começou a circular por
aquele quarto. Não era um frio normal, afinal ele não só esfriava o quarto, mas também esfriava minha alma. Sombras me abraçaram, e depois disso eu não lembro de mais nada. Não
havia me dado conta, mas acabara de morrer... Eu morri, morri sem conhecer a
Cristo. Eu sou mais uma alma. Mais uma vida tragada. Mais um jovem perdido. Mais um no Inferno.
Ellysson Rocha
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